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passagem, nos gregos ou nos latinos. Quem sabe não é apenas uma questão de
vocabulário? A palavra generositas existia em latim, mas para designar antes a
excelência de uma linhagem (gens) ou de um temperamento. Podia no entanto,
como às vezes em Cícero, traduzir a megalopsuchia dos gregos (grandeza de alma),
mais simplesmente que a pomposa magnanimitas, que é seu decalque erudito. Isso
é verdade sobretudo em francês: magnanimité [magnanimidade] praticamente não
saiu das escolas; é générosité [generosidade], sem dúvida, que melhor diz o que a
grandeza pode ter de propriamente moral e em que, de fato, ela é então uma
virtude. Assim é em Corneille ou, voltaremos a ele, em Descartes. Na linguagem
contemporânea, todavia, a grandeza conta menos que o dom, ou só é generosa
por sua facilidade em dar. A generosidade aparece então no cruzamento de duas
virtudes gregas, que são a magnanimidade e a liberalidade. O magnânimo não é nem
vaidoso nem baixo, o liberal não é nem avaro nem pródigo, por isso são sempre
generosos, quando não se identificam.
Mas isso ainda não é o amor e não faz as vezes dele.
A generosidade é a virtude do dom, dizia eu. Dom de dinheiro (pelo qual tem a
ver com a liberalidade), dom de si (pelo qual tem a ver com a magnanimidade, ou
mesmo com o sacrifício). Mas só podemos dar o que possuímos e somente com
a condição de não sermos possuídos. Nisso a generosidade é indissociável de
uma forma de liberdade ou de domínio de si que será, em Descartes, o essencial
de seu conteúdo. De que se trata? De uma paixão e, ao mesmo tempo, de uma
virtude. A definição é dada num artigo famoso do Tratado das paixões, que convém
citar integralmente:
Creio assim que a verdadeira generosidade, que faz um homem se estimar
ao mais alto grau que ele pode legitimamente estimar-se, consiste, apenas,
parte em ele saber que não há nada que lhe pertença verdadeiramente além
dessa livre disposição de suas vontades, nem por que ele deva ser elogiado
ou censurado, a não ser por usá-la bem ou mal; parte em ele sentir em si
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André Comte-Sponville
uma firme e constante resolução de bem utilizá-la, isto é, nunca carecer de
vontade para empreender e executar todas as coisas que julgar serem as
melhores. O que é seguir perfeitamente a virtude.
A redação é um tanto laboriosa, mas o sentido é claro. A generosidade é ao
mesmo tempo consciência de sua própria liberdade (ou de si mesmo como livre e
responsável) e firme resolução de bem usá-la. Consciência e confiança, pois:
consciência de ser livre, confiança no uso que se fará disso. É por isso que a
generosidade produz auto-estima, que é muito mais conseqüência dela do que seu
princípio (distingue a generosidade cartesiana da magnanimidade aristotélica). O
princípio é a vontade e nada mais que ela: ser generoso é saber-se livre para agir
bem e querer-se assim. Vontade sempre necessária, para Descartes, e sempre
suficiente, se efetiva. O homem generoso não é prisioneiro de seus afetos, nem
de si; ao contrário, é senhor de si e, por isso, não tem desculpas nem as procura.
A vontade lhe basta. A virtude lhe basta. Nisso coincide com a generosidade no
sentido comum do termo, explica-o o artigo 156:  Os que são generosos dessa
maneira são naturalmente levados a fazer grandes coisas, e todavia a não
empreender nada de que não se sintam capazes. E por não estimarem nada maior
do que fazer o bem aos outros homens e desprezar seu próprio interesse, por
causa disso são sempre perfeitamente corteses, afáveis e oficiosos [serviçais] para
com todos. E além disso são inteiramente senhores de suas paixões,
particularmente dos desejos, do ciúme e da inveja&  A generosidade é o
contrário do egoísmo, como a magnanimidade o é da mesquinharia. Essas duas
virtudes são uma só e mesma coisa, assim como esses dois defeitos. O que há de
mais mesquinho que o eu? O que há de mais sórdido do que o egoísmo? Ser
generoso é ser livre de si, de suas pequenas covardias, de suas pequenas posses,
de suas pequenas cóleras, de seus pequenos ciúmes& Descartes via nisso não
apenas o princípio de toda virtude, mas o bem soberano, para cada um, o qual
consiste apenas, dizia ele,  numa firme vontade de agir bem e no contentamento
que ela produz . Felicidade generosa, que reconcilia, dizia ele ainda,  as duas
opiniões mais contrárias e mais célebres dos antigos , a saber, a dos epicuristas
(para os quais o bem soberano é o prazer) e a dos estóicos (para os quais é a
virtude). O Jardim e o Pórtico, graças à generosidade, finalmente se encontram.
Que virtude é mais agradável, que prazer mais virtuoso, do que desfrutar sua
própria e excelente vontade? Onde encontramos a grandeza de alma: ser
generoso é ser livre, e é esta a única grandeza verdadeira.
Quanto a saber o que é feito dessa liberdade, é outra questão, mais metafísica do
que moral, da qual a generosidade não depende nem um pouco. Quantos avaros
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Pequeno Tratado das Grandes Virtudes
acreditaram no livre-arbítrio? Quantos heróis não acreditaram? Ser generoso é ser
capaz de querer, explica Descartes, e portanto de dar, de fato, quando tantos
outros não sabem o que desejar, o que pedir, o que pegar& Vontade livre? Sem
dúvida, pois ela quer o que quer! Quanto a saber se ela teria podido querer outra
coisa, e mesmo se essa questão tem sentido (como poderíamos querer outra coisa
que não a que queremos?) é um problema de que já tratei suficientemente em
outro lugar, e que não tem seu lugar num tratado das virtudes. Seja uma vontade
determinada ou não, seja ela necessária ou contingente (seja livre no sentido de
Epicteto ou no de Descartes), ela não deixa de se confrontar com as
mesquinharias do eu, e só ela, fora a graça ou o amor, é capaz de vencê-las. A
generosidade é esse triunfo, quando a vontade é sua causa.
Poder-se-ia preferir, é claro, que o amor bastasse. Mas, se ele bastasse, teríamos
necessidade de ser generosos? O amor não está em nosso poder, nem pode estar.
Quem escolhe amar? O que pode a vontade sobre um sentimento? O amor não
se comanda; a generosidade sim: basta querer. O amor não depende de nós, é o
maior mistério, por isso escapa às virtudes, por isso é uma graça, e a única. A
generosidade depende dele, por isso é uma virtude, por isso se distingue do amor,
inclusive nesse gesto do dom pelo qual, no entanto, ela se parece com ele.
Ser generoso seria, pois, dar sem amar? Sim, se é verdade que o amor dá sem
precisar para tanto ser generoso! Que mãe se sente generosa por alimentar seus
filhos? Que pai, por cobri-los de presentes? Eles se sentiriam antes egoístas por
fazerem tanto pelos filhos (por amor? sim, mas o amor não desculpa tudo) e tão
pouco pelos dos outros, ainda que infinitamente mais infelizes ou mais
desprovidos que os seus& Dar, quando se ama, está ao alcance de qualquer um.
Não é virtude, é graça irradiante, é plenitude de existência ou de alegria, é efusão
feliz, é facilidade transbordante. Será mesmo dar, já que não se perde nada? A
comunidade do amor torna todas as coisas comuns; como poderíamos nela dar
prova de generosidade? Amigos de verdade, observava Montaigne,  não podem
se emprestar nem se dar nada , pois tudo é  comum entre eles , tal como as leis,
dizia ele,  proíbem as doações entre o marido e a mulher, querendo inferir com
isso que tudo deve ser de cada um e que eles não têm nada a dividir e partir
juntos [compartilhar] . Como dariam entre si prova de generosidade? Que as leis [ Pobierz całość w formacie PDF ]

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